quinta-feira, 2 de julho de 2009

A BALANÇA DESIQUILIBRADA



O legislador brasileiro tem relevado uma grande dificuldade de lidar com a balança. Quando, vencida a estiagem democrática, veio a lume a Carta de 1988, nela ficou escrito que um dos objetivos fundamentais da República brasileira seria “construir uma sociedade livre, justa e solidária”. Além de evocação ética, a expressão se agiganta como comando jurídico de observância obrigatória. Mas não adianta, a balança continua pensa: os interesses pessoais e corporativos pesam mais que a justiça e a igualdade.

Em época mais recente, a pretexto de aperfeiçoar o Judiciário, foi editada a Emenda Constitucional 45/2004, na qual o legislador inseriu uma norma proibindo magistrados e promotores de exercerem a advocacia perante os juízos ou tribunais onde houvessem atuado, pelo menos durante três anos após a aposentadoria. Presumiu que, mudando logo de profissão, poderiam valer-se do prestígio amealhado ao longo da antiga carreira e vir a comprometer a imparcialidade das decisões judiciais, beneficiando indevidamente seus clientes.

O propósito não seria ruim se não fosse obscuro e discriminatório. Observe-se que, enquanto aos juizes e promotores é imposta uma quarentena mínima de três anos, outros agentes públicos migrado sem qualquer estágio, diretamente dos palcos esfuziantes do parlamento ou da capatazia ideológica dos governos para as cadeiras monásticas dos tribunais superiores. E, com as paixões partidárias ainda incandescentes, vão logo despejando liminares e sentenças, sem excluir do rol dos favorecidos nem mesmo os governantes que os patrocinaram, conquanto albergados nos partidos políticos cujos interesses até então defendiam com abnegação e fervor.

Pelo menos algum freio a eles deveria também ser imposto. Não é razoável nem se afeiçoa com o princípio da igualdade a premissa de que seriam menos suscetíveis a paixões do que os juizes e promotores. Por isso, a judicatura não poderia ser-lhes liberada sem peias. Não que se possa ou se deva, generalizadamente, negar-lhes a virtude da imparcialidade. Mas a questão é que, para a sociedade, ficará sempre o tormento da dúvida — se a decisão foi ou não imparcial. Isto não é bom para a paz social. Nem para a justiça.

3 comentários:

  1. Amigo Alberton:
    É com enorme prazer que tenho lido teus comentários, após encontrar o blog do Alberton! és um referencial ético e intelectual do Ministério Público Brasileiro.
    fraterno abraço
    Roberto Neumann

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  2. Pabéns pelo bog, muito bem escrito e relevando sempre a informação!!! Também sou um Alberton e se quiser conhecer meu blog, só q ele é esportivo, mas é legal também: www.eduardoalberton.blogspot.com abração!!!

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  3. Tudo fruto da banalização da safardagem. Alguns riem quando se fala em ética, outros (e falo também de meus pares) de qualquer viés humanista que o discurso traduza. Somos apodados de filosófos sem espaço na praia do pragmatismo, entenda-se dos favores, do compadrio, da falta de respeito à litúrgia dos cargos, das instituições. Começaria uma reforma pelos critérios do Quinto (antigamente o notável saber jurídico era notável e a militância profissional quesito inafastável, não bastando o conchavo político, imperial, subterrâneo e a proximidade com o sr. nomeador, digo, governador). Parabéns pelo blog, sempre que possível passearei por estas sendas.

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